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O Convento das Bernardas: 30 Anos de Transformação e Comunidade em Lisboa

há 6 horas

O Convento das Bernardas, em Lisboa, viveu 35 anos de precariedade antes de ser reabilitado. Hoje, é um espaço de habitação acessível, refletindo o valor da comunidade na cidade.

O Convento das Bernardas: 30 Anos de Transformação e Comunidade em Lisboa

O Convento das Bernardas, situado na Madragoa, Lisboa, foi, durante os anos 1990, um lar para mais de 100 famílias que habitavam um espaço de condições muito precárias. Originalmente um convento feminino do século XVII, esta edificação, que tinha uma história rica, conheceu o auge da sua degradação até ser transformada num complexo de habitação acessível, onde se aliam comércio e serviços.

Nos séculos XVI e XVII, a construção de conventos na zona de Lisboa, que abrange bairros como Lapa e Santos, foi incentivada pela aristocracia, com o objetivo de oferecer abrigo a filhas de aristocratas sem dote e a outros membros da família. À volta destes locais, começava a formar-se uma comunidade popular, que gradualmente ocupou as pequenas habitações ao redor, vitais para o funcionamento diário dos conventos.

Com a extinção das ordens religiosas no século XIX, muitos conventos passaram a ser vendidos e utilizados para habitação. O Convento das Bernardas, localizado na antiga zona da Mocambo, tornou-se um exemplo do que era a habitação precária, com o proprietário a alugar celas a famílias que dependiam do trabalho nas atividades ribeirinhas.

O período de maior sobrecarga aconteceu em 1990, quando o convento estava repleto de famílias em situações vulneráveis. Adultos e crianças utilizavam os espaços comuns para cozinhar e brincar, numa comunidade resiliente, mas a viver em condições extremamente difíceis.

A reabilitação do convento, que teve início em 1999 sob a gestão da Câmara Municipal de Lisboa e com financiamento de fundos europeus, permitiu redistribuir as famílias que viviam ali. Com o projeto, algumas famílias puderam regressar às suas novas habitações, enquanto outras receberam compensações para se mudarem. Somente 34 famílias escolheram permanecer, recebendo casas ajustadas ao seu agregado familiar.

A obra não só modernizou as infraestruturas, mas também revelou património escondido, como a chaminé barroca e diversas pinturas ornamentais, integradas no novo projeto. A antiga capela, que outrora acolheu o Cine-Esperança, foi restaurada para servir como um auditório do atual Museu da Marioneta.

A história do Convento das Bernardas é também marcada por memórias de quem ali cresceu. Natalino de Jesus, fadista de 70 anos, relembra os desafios e a solidariedade da comunidade que o acolheu durante a infância. As vivências coletivas e as conexões entre vizinhos eram essenciais para a vida no convento.

Filipe Lopes, arquiteto responsável pela reabilitação, salienta a importância de respeitar a identidade das comunidades e a necessidade de as manter integradas nas transformações urbanísticas. Este projeto na Madragoa é visto como um exemplo de preservação comunitária, ao contrário de outras intervenções que buscam a conversão de património em serviços ou turismo.

Gonçalo Antunes, especialista em políticas de habitação, defende que o sucesso do Convento das Bernardas deve servir de modelo para futuras intervenções em Lisboa, especialmente numa cidade cada vez mais pressionada no acesso à habitação.

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#ReabilitaçãoUrbana #HabitaçãoAcessível #HistóriaViva